terça-feira, 25 de março de 2008

Concorda comigo?

- Mãe! A Rosana fez uma tatuagem tão linda... Eu queria fazer uma também.
- Quantas vezes eu vou ter que lhe dizer não?
- Deixa, por favor!
- Não é não, Gabriela. E não insiste!
- Ah... Lembra da Silvinha?
- Silvinha?
- É, mãe! Aquela ruivinha que dormiu aqui em casa algumas vezes.
- Ah, sim... Lembro. O que é que tem ela?
- Tá grávida.
- Minha nossa! Tão novinha...
- Pois é!
- Eu nem imagino a reação dos pais dela quando souberam.
- Mas eles não sabem.
- Não?
- Não. Ela pretende tirar antes que mais alguém fique sabendo.
- A Silvinha é doida? Como ela vai fazer um negócio desses?
- Eu disse a ela que era errado, mas ela não me escuta!
- Quando ela pretende tirar?
- Não sei, mas acho que não vai demorar muito pra que ela faça isso.
- Alguém precisa impedi-la. Ela não pode fazer essa loucura. Além de tudo, o aborto é um ato criminoso!
- Ela sabe, mãe. Mas está tão desesperada...
- Nossa! E o namorado da Silvinha?
- Ela não tem namorado.
- Não? O pai da criança, sei lá!
- Ela não sabe quem ele é.
- Nossa! Essa Silvinha, também! Ô menina sem juízo, essa sua amiga. Ei, mas... espera!
- Quê?
- A sua amiga ruivinha não se chama Sofia?
- Er... Ahn...
- Gabriela! O que é isso na sua cintura?
- Er... Uma tatoo.
- Quantas vezes eu lhe disse que se colocasse tatuagem eu tiraria com a faca?
- Ah, mãe... Pior seria se eu estivesse grávida, não acha?

segunda-feira, 24 de março de 2008

No meio da noite

São duas e meia da madrugada e o meu celular está tocando.

- Não vai atender?
- Não. Será que o infeliz que tá ligando não percebe que já é tarde? Daqui a pouco, desiste.

Viro pro lado. O celular continua tocando. Viro novamente.

- Que saco! Esse povo por acaso não sabe que horas são?
- Atende!
- Não.
- Se você não atender, vão continuar insistindo.
- Que saco!

Pego o celular, que pára de tocar.

- Desistiu.

Volto a deitar. No instante em que tudo parece calmo, ele toca novamente. Impaciente, pego o celular e desta vez consigo atendê-lo.

- A cobrar? Mas é muita cara de pau!

Desligo. O celular toca, insistente.

- A cobrar, de novo?
- E se for importante?
- Alguém me ligando a cobrar, essa hora?
- Atende, vai! Já estamos acordados mesmo...

[Gravação]

- Pois não?
- Natália?
- Não. É engano!

Desligo. [...] O celular toca mais uma vez.

- Que inferno! [...] Meu querido, eu já disse que não existe nenhuma Natália aqui!
- Não, por favor... Não desliga o celular!
- Olha aqui... São duas da manhã [olho pro relógio]; aliás, duas e meia, e você quer ficar jogando conversa fora?
- Desculpa. É que a minha esposa viajou e estou na rua, sem chave.
- Sinto muito, mas não posso lhe ajudar.
- Por favor... Chama um chaveiro pra mim.
- Como é que é?
- É que eles não aceitam ligações a cobrar e nenhuma das outras pessoas com quem tentei falar me atendeu.
- Por que não me espanta o fato de não terem lhe atendido?
- Por favor!
- Tudo bem. Dá seu endereço. [...] 'Benhê', dá uma folha de papel!
- Rua das Acássias, 325, apartamento 32.
- Tudo bem, vou mandar o chaveiro. Boa noite.
- Obrigado e desculpa o incômodo.

Olho pro meu marido, que ri com o que acaba de ler.

- Você sabe com quem estava falando?
- Faço a mínima idéia!
- Você não lembra quem mora nesse endereço? [E me estende o papel...]
- Não.
- O seu primo, Adalberto.

quarta-feira, 19 de março de 2008

'Me' explica!

Pára de olhar pra mim como se soubesse o que estou sentindo! Não vê que são apenas lágrimas o que trago nos olhos? A angústia que supõe ter visto é fruto da incerteza que traz com você. Eu nunca perco o controle nem me deixo abater facilmente. Pelo menos, até agora...
Por que você não me abandona? Por que não vê que tudo o que lhe peço é apenas isso? Desejo que vá embora; procure um outro alguém. Talvez aquela com quem estava antes de encontrar-se comigo. Por que ainda lhe ouço chamar meu nome? Já não lhe disse ser esta uma palavra proibida? Por que ainda lhe desejo perto? Talvez porque não me canse de sofrer.

terça-feira, 18 de março de 2008

Futuro simples e terceira do plural

Mesmo distante, saiba que a cada momento a sua lembrança me acompanhará e será o meu consolo. Sua imagem tornará confortável todo o restante dos meus dias, ao menos aqueles em que a sua ausência não insistir em desgraçar de vez. O seu sorriso estará para sempre vivo na minha memória e a cada novo dia eu o ansiarei novamente. Em meus olhos guardarei a cor dos dias floridos em que passeamos juntos por entre as vielas dessa cidade, que agora está triste, sem você. Eu sofro... E assim vou vivendo, aguardando o dia em que nos encontraremos no infinito. Sinto como se pudesse me ouvir... Meu desabafo talvez lhe cansasse os ouvidos, mas jamais saberei, já que não pode me responder. Eu lhe sinto aqui e agora, tão presente em mim! Mesmo estando perto, sentirei saudades.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Tenho medo

Tenho medo de sair sozinha,
de ser violada,
de me perder nas ruas,
de ser odiada.

De fechar os olhos,
de andar no escuro,
de trovões e raios,
de me sentir só.

Tenho medo de tudo um pouco...
Talvez de mim, mais do que de qualquer outra coisa.

Do que possa fazer,
do que possa pensar,
do que possa sentir
ou deixar de sentir.

Tenho medo dos meus pensamentos.
De errar,
de pedir o perdão que não mereço.

Tenho medo de sentir...
E isso faz toda a diferença.

domingo, 9 de março de 2008

Impressões

Poucos amigos, nenhum namorado, todos os motivos do mundo para ser feliz. Ao menos é assim que lhe descreveriam os seus amigos nem-tão-íntimos, próximos o suficiente apenas para os programas dominicais. Um filme ao qual ela sempre assiste sozinha, uma conversa sem sentido e sem graça, um lanche do qual se serve apenas para acompanhá-los.
Triste menina, por que anda cabisbaixa? Não vê que lá fora há um mundo cheio de possibilidades? Antes de se sentir só, olhe em volta. A natureza não lhe pede que se esforce; ela silencia em respeito a sua dor.
Busca encontrar algum sentido ‘para o que’ ainda não sabe. Não pede que lhe entendam, nem mesmo que aceitem; só deseja um carinho autêntico de vez em quando. O que sente é tão óbvio... Por que será que ninguém percebe?
Já amou e desamou diversas vezes. Chorou sem motivo, brigou, pediu perdão... já pôs tudo a perder centenas de vezes. Magoou quem mais gostava, quis poder voltar atrás. Percebeu-se incapaz de ‘se perdoar’.
Tentou agradar a todos, já quis salvar o mundo e deu a ele o seu melhor sorriso. Mas nunca foi o suficiente!
Hoje ela anda devagar; quase tropeçando em seu cadarço desamarrado. Uma foto guardada com carinho, rascunhos e rabiscos de cartas apaixonadas. Se apega às boas lembranças, pois esse sentimento, sabe que ninguém lhe poderá negar.

sábado, 8 de março de 2008

amizade

se você pensar bem, sempre houve momentos em que no fundo você sabia serem importantes. aquele instante, pequeno, que a maioria dos humanos permite passar, um rosto pelo qual se tem certeza que os calcanhares devem dar meia volta e seguir mas que, mesmo a certeza estando presente, a inércia é mais forte e continuamos (ou continua-se) a andar. sendo ele humano, ele também sentiu esse momento, não foi por um rosto - agora não é a hora apropriada para romantismos rasgados. sentiu e, a despeito de sua humanidade, parou e voltou, sinceramente acho que estatisticamente, apenas por esse ato, ele deve estar num grupo de um centésimo por milhões. ele parou para um gato, preto, não sejam supersticiosos ainda. o bichano o olhou como se olhasse uma antiga refeição, um tanto de superioridade e de familiaridade, ele olhou o bichano como se olhasse um antigo amigo. as amizades de Carlos são assim, há sempre uma hierarquia inflexível. melhor para os amigos. carlos, esteja claro, é o nome do gato, não ainda, mas depois que José o levar para casa. José é o bípede. mundo estranho esse em que quadrúpedes estão sujeitos a conviverem com bípedes por causa de alimento, víveres, para ser exato, isso teria sido o que Carlos teria pensado se gato não fosse, mas dizemos nós por ele. para que não tenhamos de dizer sempre por outros, mudemos o foco da história.
José nunca teve um animal, nenhum nunca o tinham atraído, mentira, de José, ao narrador cabe apenas a verdade, José nunca tinha sequer pensado em animais. mas aquele gato não foi uma questão de pensamentos, eles simplesmente se acharam. José se achava tão ligado àquele gato que pareciam terem se conhecido quando ambos eram filhotes, e Carlos estava no apartamento havia poucas horas, comido o suficiente por dias, bem verdade, mas as horas do relógios são objetivas, independente das fomes, que são, para homens e gatos, várias. Voltemos ao afeto que serão eles a dar aos ouvintes, a José e a Carlos a história. Carlos não pensava nada, José era só alegria, tinha uma companhia, pensou em locar alguns vídeos para assistir com o novo amigo. fazia tempo que o tocador de dvd não era ligado, visitas não são muito frequentes aqui. música também não era, mas veja que alegria um bichano traz a um lar, faz algumas horas, mais horas do que fazia antes, que ouves-se claramente sons ritmados e melodias variadas que vêm desse apartamento. os vizinhos, sempre chatos, reclamam, Mas que porra, onde já se viu música a uma hora dessa, Você está doido seu viado, não se sabe se isso foi uma pergunta ou uma afirmação, José não se importou, não nos importemos também. o que importa é que o vídeo foi locado e estão, José e Carlos, a assistir a ele. nunca se verá cena tão linda, lado a lado, ao menos um deles está olhando para a tela. então o bandido morre no final. uma cena comum em filmes comuns. isso nunca aconteceria na realidade, o cara descarregou um pente de fuzil e não acertou um tiro, diz José, Não sei, a realidade pode ser bem estranha, responde Carlos.

essa crônica foi para pagar uma dívida e obedecer uma ordem.

terça-feira, 4 de março de 2008

Telemarketing

– [...] Essa que o senhor possui é a versão 2.0.

– Até agora a atualização não apresentou nenhum defeito. Mas se eu decidir devolver?

– Desculpa, o contrato não prevê devolução. O que o senhor deverá fazer, em caso de defeito, é procurar a assistência técnica mais próxima.

– Só espero que haja alguma por perto. E se o defeito for de fabricação?

– Não se preocupe... o produto estará assegurado nesse caso, sem adicionais nos custos, se for comprovada alguma falha técnica. No caso de defeitos não-especificados no manual, o senhor deve se dirigir ao balcão de reclamações...

– Sabia que estava faltando alguma coisa! A minha veio sem manual.

– O senhor por acaso teria um comprovante de compra? Porque sem ele é inviável qualquer tipo de reclamação.

– Sabe o que é? É que eu ganhei de brinde em um desses sites de relacionamentos...

– Os procedimentos adotados na nossa companhia visam o bom atendimento e a satisfação dos nossos clientes; mas não podemos ajudá-lo caso não seja comprovada a aquisição dos nossos serviços, através da compra legítima e legal. Sinto muito.




*caiu a ligação*




Acreditem ou não... essa foi uma conversa [adaptada] de bate-papo. Ah... o “produto” sobre o qual estão falando não é um eletrodoméstico, mas uma pessoa, em sua versão 2.0 (piada interna). Não... não vou contar com quem tive essa conversa altamente produtiva. X)

segunda-feira, 3 de março de 2008

Lembranças

Cenas corriqueiras me remetem à infância: ao tempo em que minhas únicas preocupações eram 'saber quantas moedas se faziam necessárias' e 'ter os meus pais sempre por perto'. Hoje as moedas não mais me impressionam; e não temo [como antes] não encontrar os meus pais ao chegar em casa.

O cheiro da grama recém-cortada, o estalar dos beijos da minha mãe... Tudo isso em mim permanece de alguma forma. A primeira escola, os amigos queridos, os planos de fugir de casa. É... fugir de casa! Qual a criança que nunca se irritou com a mãe, juntou os brinquedos na mochila e pensou em sair, mundo afora?

A minha avó não preparava bolinhos. Mas, sempre que podia, fazia questão de nos agradar. Na época, eram cerca de 8 netos. Esses, seus por natureza; outros tantos, do coração. Lembro também que de vez em quando algum de nós aprontava. Então ela gritava "ô, menino!" e sabíamos que alguém em casa iria apanhar.

Essa saudade aumenta a minha fragilidade. Não falo apenas por mim, egoísta e enganadora, mas por uma lembrança compartilhada com ternura e bondade.

Recordações que me fazem bem, que me trazem um vazio, que me fazem chorar. Sentimentos há muito esquecidos, mas que vêm e vão, só para me lembrar que, enfim, fui feliz.

domingo, 2 de março de 2008

Você vem sempre aqui?

– Oi. Você vem sempre aqui?
– Ah, não... esse papinho besta não... Pelo amor de Deus! Vocês homens poderiam tentar ser mais originais de vez em quando! Acham mesmo que conquistam alguma mulher assim?
– Mas eu só queria...
– Eu sei, eu sei. Um cafezinho agora, uns beijinhos mais tarde e depois, quem sabe, conhecer meu apartamento. Vocês acham que todas nós somos bobas? Fáceis? Carentes?
– Mas eu não...
– Eu sei... Você é diferente de todos os outros; é claro!
– Não, moça, você não está entendendo.
– Quer saber? Não estou interessada!
– Nem eu!
– Que? Como assim?
– Não estava dando em cima de você. Aliás, eu tenho namorada. Estava apenas querendo saber se o ônibus costuma demorar aqui, nesse ponto.